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DESTINADOS À MULTIPLICAÇÃO 

Exposição Individual - Temporada de Projetos, Centro Universitário Maria Antônia, São Paulo, Brasil

por Guy Amado

Seria pertinente, embora de não muita serventia, relatar que a presente exposição resulta de extensa pesquisa empreendida pela artista em torno de aspectos e fatores históricos envolvendo o prédio e arredores do Maria Antonia. Mas o fato é que após uma filtragem e assimilação bastante personalistas de todos os dados levantados, Fernanda Chieco chegou à imagem de uma melancia como elemento central para seu trabalho.

 

Sim, a melancia; que agora se apresenta como protagonista algo inusitado de uma ocupação de matizes enigmáticos e instigantes. Ou melhor, impõe-se como uma imagem-matriz de nexos inseridos numa lógica peculiar de rebatimentos associativos e simbólicos. Digo peculiar porque pode ser áspero e eventualmente infrutífero (com o perdão do trocadilho) buscar um sentido imediato numa situação expositiva em que a cucurbitácea divide a cena com um lascivo casal de elefantes.

 

É sabido que melancias possuem um inegável apelo por suas qualidades plásticas, que ativam as leituras simbólicas decorrentes: suculentas, saborosas e internamente da cor da paixão, são particularmente afeitas a associações libidinais. Qualidade esta traduzida de modo definitivo e consagrador no filme O sabor da melancia (de Tsai Ming-Liang, 2005). Ali, a fruta era servida, sorvida e manipulada como um veículo para os prazeres e pulsões da carne, espírito (e polpa), apresentando-se como um catalisador de desejos, securas e umidades diversas. Um pouco como acontece também, em outro registro, nestes desenhos de Fernanda, embora aqui num arranjo em que sobressaem um humor oblíquo e um poderoso estranhamento  sensação intensificada pela ambientação elaborada pela artista, evocativa da função hoje longínqua deste espaço que abriga a mostra, um antigo dormitório de colegiais. Onde, quem sabe, outrora sonhou-se sonhos perversos com melancias.

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